Tuesday, December 06, 2011

Dia de luto e glória.

Sim, eu sou daquelas garotas que adoram futebol. Que já negaram um jantar romântico para ir a uma partida. Posso até dizer que sou pé quente, pelas poucas vezes que estive no estádio. E sou corinthiana. Roxa. Branca e preta, com estrelinhas amarelas. Herdei do meu pai, do meu avô. E como foi bonito o futebol no tempo deles. Eles são do tempo em que se podia ter um físico qualquer para ser jogador, sabia? Mas tinha que ser bom, tinha que ter raça, tinha que ter brilho nos olhos. Eles são do tempo em que futebol se fazia por amor, em que se ganhava pouco e se esforçava o dobro. Mas esse futebol não existe mais. Bem da verdade, também não existem mais homens como foram meu pai, meu avô e os jogadores de suas épocas.

Ainda assim, principalmente no Brasil, amor ao time não se explica. Pode ficar 23 anos na fila, pode ficar sem um título da Libertadores, pode até jogar feio. Amor ao time, principalmente quando esse time é sinônimo de povo brasileiro, como é o Corinthians, é de graça. É em qualquer tempo. E quando cai pra segundona, quando é eliminado da Libertadores, quando sofre um gol... gritamos ainda mais forte, batemos no peito orgulhosos de sermos para sempre seus súditos. A adversidade nos dá força, nos dá mais carinho ainda pelo nosso time. E claro, se conseguimos marcar um gol, se conseguimos, como domingo, conquistar um título brasileiro, dentro de um campeonato tão regular... A gente comemora, a gente vai às ruas, a gente beija a bandeira. Comigo não foi diferente (e acredito que nunca será). Ainda que eu ande desacreditada do "mercado" que virou o futebol, ainda que eu torça o nariz para os jogadores cada vez mais bombados, ainda que eu sinta uma saudade imensa de quando o futebol era jogado na raça, com dez, até onze caras correndo pra ganhar, pra fazer bonito... eu continuo amando futebol.

Mas nesse domingo foi diferente. Esse domingo foi um daqueles outros dois ou três domingos em que o Brasil acordou com a notícia que ninguém quer dar. Ele, o Magrão, se foi. No sábado, quando li que ele respirava por aparelhos, senti aquele frio na espinha. Eu já havia sentido aquilo com o meu corinthiano fanático. Não eram boas notícias. Quando minha mãe disse: "Ai filha, você viu?"... eu disse "Não". Eu não havia visto, mas eu já sabia. Nosso doutor não aguentou. Nosso doutor escolheu o dia, um dia que fosse bom para a sua nação, um dia em que começaríamos e terminaríamos chorando... e se foi.

Eu, criada entre corinthianos, o amava. Eu o amava só de ver nos VTs, eu o amava porque as pessoas que eu amo o amavam. Eu o amava com a multidão, eu o amava sem saber porquê, como se ama seu time de coração.

Há alguns anos, me aprofundando pela história daquele Brasileiro de alma e sobrenome, eu entendia o motivo. O futebol foi só o meio de aquele cara chegar às massas e dizer o que veio dizer. Aquele cara destoando dos esportistas, aquele cara franzino, que se formou médico, que chutava de calcanhar não por genialidade (dizia ele), mas pela velocidade que aquele passe dava para alguém que não tinha porte atlético, como ele.

Ele não veio para cá à toa, não foi jogar no time com a torcida mais democrática do Brasil só pelo futebol... ele veio começar uma revolução. Ele veio, como outras personalidades raras deste país, pedir a nossa voz. Lembrar que tínhamos voz. E até o fim da vida, embora um pouco mais cético, ele lutou e acreditou em tudo o que dizia.

Foi por isso que eu e o Brasil acordamos mais tristes neste domingo. Foi por isso que eu me arrepiei quando eu vi aquele estádio com o braço direito levantado, punho cerrado, fazendo uma homenagem para aquele cara que comecei a amar sem motivo e aprendi a admirar cada dia mais.

O jogo que se seguiu, o jogo que nos deu o título, foi tenso. Como ouvi por aí, quem dera aquele um minuto de silêncio fosse trocado por um minuto, ou só alguns segundos, de passes geniais. Foi um jogo nervoso, mas sem grandes momentos. Foi um jogo regular, como foi toda a campanha do meu Corinthians. Não tiro o mérito, penso até que se aprendêssemos com o Tite a ter essa calma no cotidiano... viveríamos melhor. Mas às favas com o equilíbrio. Era uma final de campeonato, e a gente queria ver gol. Não viu.

O Palmeiras, que ficou apagado durante o Brasileirão, resolveu jogar. E a ordem lá de cima, visivelmente, foi segurar o resultado. Se teve algo ali fora do protocolo, foi a provocação 'a la Valdívia' que o Jorge Henrique aprontou. E a gente já sabe (né, Edilson?) que fazer isso num momento daqueles não é exatamente uma decisão acertada. Mas vá lá, se a gente esperava algum show na final, foi esse.

O jogo acabou e eu fiquei ali, em estado letárgico, feliz pelo meu time, mas ainda esperando o 'espetáculo'. Deveria ter me acostumado ao novo futebol, onde espetáculo só acontece às vezes (geralmente lá no Santos, tenho que admitir). E então fiquei ali, pentacampeã brasileira, com todo o amor que tenho pelo Corinthians, esperando a euforia vir. Não veio.

Aliás, veio sim... depois. Quando saí pelas ruas, e vi o povo. Aquele povo que o Sócrates amava, por quem ele vencia a timidez e falava ao microfone. Ali eu descobri porque eu ainda sou apaixonada pelo meu time, ali eu me reconheci. Acenamos para os torcedores felizes, e recebemos uma 'bandeirada' (o pedágio que qualquer carro passando por ali teve que pagar, seja ele de corinthianos, palmeirenses, são-paulinos...). Pagamos o pedágio. Pagamos com um sorriso no rosto, emocionados. E fomos adiante, completamente apaixonados por essa nação que chamamos com amor de República Popular do Corinthians.